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sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

O que sabemos é uma gota, o que ignoramos é um oceano." Isaac Newton

No lobisomem...
Qual dilema que impera:
Ser a fera ou ser o homem?
Ser o homem ou ser a fera?

Martim César

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Amor se llama el juego en el que un par de ciegos juegan a hacerse daño.J.Sabina

Lo que me ha quedado de ese amor

(un tango para Sabina)

¿Y lo que me ha quedado de ese amor
El humo del cigarro en mis pulmones,
Las palabras de nostalgia en las canciones,
Algún poema de un poeta sin valor?

¿Y lo que me ha quedado de ese amor
Una cuenta bancaria en color rojo
Una lágrima eternizada en mis ojos
Una imagen que va perdiendo su color?

Me ha quedado un calendario de mil noches trasnochadas
Un navegante ahogado en mar de vino
Un caminante sin estrella y sin camino
Una extraña sensación de ver que todo es casi nada

Me ha quedado un desierto sin oasis de agua pura
Una floresta apiñada de hojas muertas
Una llave que no abre más la puerta
Y un pasaje sin regreso al país de la locura

¿Y lo que me ha quedado de ese amor
Una carta olvidada en un cajón
Un loco timonel en un navío sin timón
Y los pétalos ya marchitos de una flor?

¿Y lo que me ha quedado de ese amor
Una mujer que se llevó todos mis sesos
Ese olvido que me duele hasta los huesos
Este suicida que no muere por temor?

Martim César

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Meu velho um dia falou, com seu jeito de avisar: olha, o mar não tem cabelos que a gente possa agarrar. Paulinho da Viola







O dia que a morte não veio

Estava acertado o final
Hora e lugar do combate
(Pois desde o berço o mortal
Espera a faca que o mate)

Mas ao chegar o arremate
O instante grave e fatal
A morte – num disparate –
Negou seu próprio ritual

O dia em que a morte não veio
Tenho pra sempre guardado
Pois ela inventou um meio
E faltou ao encontro marcado

O dia em que a morte não veio
É uma lição aprendida:
Pois ela - por ter receio -
Enfim rendeu-se pra vida

Não morreu quem deveria
Não chegou quem se esperava
A morte – estranha ironia! –
Fingiu que bem morta estava

Ah! Eu sei que ela volta um dia
Pois sempre vem, cedo ou tarde,
Mas vai me ver – quem diria?
Tendo ela por covarde

Martim César

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

O que mata a sede não é o copo... e sim a água. Glenio Fagundes

Poema a ser reescrito

Quando me busco por dentro
No poço fundo de mim
Sem rumo e insone me perco
Preso num enredo sem fim

Quem saberá o segredo
Dos medos que eu já não nego?
(Qual luz que habita o silêncio
da imensa noite dos cegos)

Eu queria uma alma serena
(Que só na infância se tem!)
Um papel esperando um poema
Sem saber qual o verso que vem

Eu queria uma vida reescrita
E outra vez sentir a emoção
Da magia sem par dessa hora
Em que nasce uma nova canção

Mas quando, às vezes, no escuro
Em mil lembranças me acendo
- Madrugado e desperto -, descubro...
Jamais há um regresso no tempo!

Martim César

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

O primeiro pecado da humanidade foi a fé; a primeira virtude foi a dúvida. Carl Seagan







Do universo que eu não sei

Talvez a visão insana dessas meninas sem rumo
Talvez os rastros de errante nas madrugadas insones
Talvez o viver boêmio por entre as copas e o fumo
Talvez os olhos mendigos da mais antiga das fomes

Talvez a saudade ainda viva de um querer que se foi
Talvez o andar vazio de quem não sabe aonde vai
Talvez o segundo urgente de quem não tem um depois
Talvez a vida perdida sem encontrar nenhum cais

Eu sei de corcéis alados cavalgando sobre a noite dos caídos
Sei das galés enfrentando o mare nostrum e da Roma milenar,
Eu sei dos persas, dos hebreus, sei da Atlântida submersa
Eu sei do Egito, da madre Grécia, dos seus deuses já vencidos
Eu sei da luta... sim...da eterna luta no covil de um mesmo ser
O bem e o mal, ser ou não ser, em vez de Abel... melhor Caim
E enfim cair, meu bem, pois eu não sei – ó!meu amor –
não sei de mim! Pois eu não sei – ó!meu amor – não sei de mim!

Talvez esse verso amargo de mais um poeta sem luz
Talvez o destino infame de queimar meus próprios navios
Talvez o peso inclemente de quem carrega a sua cruz
Talvez o ‘talvez’ que sempre fez um deserto de um rio

Martim César

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Sinto uma dor esquisita das ruas de Porto Alegre, onde jamais passarei... Mario Quintana (o mapa)





Desde o cais de uma janela

Quando vejo nos teus olhos
O meu sol amanhecer
Uma saudade me invade
Que nem sei de onde vem

Feito a flor da corticeira
Anunciando a primavera
Tenho em ti todas as cores
Desde o cais de uma janela

Sou um pouco dessas ruas
Que bem sabem dos meus passos
Tantas noites no teu frio
Tantas tardes de mormaço

Na usina de mil noites
Quintaneei teu mapa em mim
No néon das tuas calçadas
Becos, bares, madrugadas
Vou buscando nos acordes
Dos poetas dos teus sonhos
Os motivos por que eu vim

Velho porto dos casais
Quanta vida em ti existe!
Meu pedaço no universo
Que me alegra se estou triste

Velho porto dos casais
Muito alegre não sou não!
Mas se ando assim sozinho
Mas tão só de não ter jeito
Sei que vertes no meu peito
Um rio grande de palavras

Nos versos de uma canção!

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Um dia voltei; voltei sem contar pra o moço, pra moça, pra o velho, pra todos, que o além do horizonte é apenas o dia que volta amanhã. Luiz Menezes




De barro e luz

Jeito de rio
Meu canto, como tantos
Tem em si

Navegador
Nos versos que o universo
Pôs em mim

O mesmo rio
Que embalou a minha infância
Ainda em flor

E hoje me vê
Em suas margens na idade
Do sol-pôr

Chegando ao fim
Vai minha vida como um barco
Rumo ao cais

De barro e luz
Na essência todo homem
Sempre será

De barro e luz
Depois só luz...(talvez só luz)
E nada mais!!!

Martim César

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

En la América la nuestra, de açúcar, cobre y café... no hay motivo para fiesta, quinientos años de qué? Belchior/L.Carrero




Olhos de índio

Sobre um rio de asfalto onde os carros navegam
Dois mundos se enxergam, frente a frente existindo
Nos olhos do branco brilham luzes que cegam
Nos olhos do índio só o passado perdido

Quem avista da estrada seu tristonho presente
Seu viver inclemente de abandono e amargura
Despreza o seu jeito por ser tão diferente
E nem ao menos pressente sua milenária cultura

Personagens estranhos desse novo cenário
Onde regras e horários encarceram os homens
Onde crescem cidades de milhões solitários
De prateleiras repletas e de tantos com fome

São olhares distantes nas margens da estrada
Histórias veladas que o tempo desfez
Nas cestas de vime a herança deixada
A planta arrancada não germina outra vez!

Martim César

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

O livro é uma extensão da memória e da imaginação. Jorge Luís Borges

Luz Andaluz

O Pampa delira nos versos de Borges
Onde o tempo circula e o que foi voltará
Artigas traído cavalga ao exílio
E o brilho de Halley se faz lua no olhar

A carreta que cruza uma estrada sem fim
Vê o primeiro avião navegando no céu
Um visionário constrói seu castelo no campo
E Neruda povoa de magia o papel

Quintana caminha pelas ruas de um porto
E o Guaíba eterniza mais um pôr-de-sol
Atahualpa professa seu silêncio profundo
Nos bares do mundo Elis Regina solta sua voz

Garibaldi descobre a coragem de Anita
E nas missões jesuítas bate um sino outra vez
Uma rádio anuncia que Gardel já partiu
Mas seu quadro sorri desde “un viejo almacen”

Luz andaluz
Estrela cadente brilhando pra sempre
Nas noites do sul

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Até sei como tudo começou... mas não tenho a mínima idéia de onde isso vai parar!



De luz e sombras
(Era Borges o cego, ou cegos seremos nós?)

Quando o sol morreu no olhar
Ainda restaram as estrelas
Mas depois de o céu nublar
Já nunca mais pôde vê-las

No pátio imenso das casas
Envelheceram as meninas
O tempo que a tudo abrasa
Vestiu de luto as retinas

Quem tem a visão do mundo
Enxerga, ás vezes, sem ver
E passa a vida no fundo
Da escuridão do seu ser

Mas quem da dor fez o verso
E da tormenta fez calma
Descobriu outro universo
Na senda oculta da alma

Como fantasma entre vivos
Conhecedor de dois planos
O cego entre os seus livros
Riu dos limites humanos

Entre mortais, fez-se mago
Farol, nos mares da vida
Onde nós, pobres náufragos
Ainda estamos à deriva


Martim César

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Tenho asas, mas não vôo. Minha alma está presa na gaiola do meu próprio corpo.

Quando estou longe de mim

Agora que a vida vem
Pintar geadas no meu cabelo
E que este céu de inverno
Já se esqueceu das estrelas
É que repenso a distância
Que me trouxe até aqui
É que estranhamente percebo
Que eu estou longe de mim

Quanto de mim se extraviou
Pelas curvas do caminho
Quantas flores perdi
Por medo dos seus espinhos
Quanto de mim silenciou
Do outro lado da porta
Quanta vida represada
Num rio de águas revoltas

Uma parte de mim quis ser mar
E saiu, qual navio à procura de um cais
Outra parte de mim quis voar
E foi chão...solidão... calmaria sem paz

Por sorte a vida renasce
No sol de cada manhã
E essa certeza é que embala
Os acordes desta canção
Senão seriam mais tristes
As noites que eu já vivi
E eu estaria, por certo
Bem mais distante de mim

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Minha vida é um quebra-cabeças, onde sempre está falatando alguma peça. Sempre que tento montá-lo a peça que falta já não é a mesma.

A cuatro manos

El peón avanzó a la quinta de Tertuliano
Pasos de tango en el centro de la cancha
Como un godo desafiando al rey romano
Cual molino frente al loco de La Mancha

Y en el tablero: tierra ajena y no tan ancha
Un negro alfil se le interpone mano a mano
Pero no teme a esa muerte que se ensancha
Y cuadro a cuadro gambeteando va el paisano

Se esquiva de una torre. Otra más. Y sigue el juego
El tiempo ya se agota... al instante todo es drama
Acercándose a la octava, arremete, pecho en fuego

Y grita: ¡Jaque¡ y ahí está por conquistar al fin la fama
¡Y pierde todo! Lleva un mate, un jaque mate el andariego
Y se va el gaucho sin caballo, sin honor y
sin la dama



Jorge Passos/Martim Cesar

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

A natureza é grande nas coisas grandes e grandíssima nas pequeninas. Saint Pierre


Domadores de los vientos

Hay un cielo de pescadores
Sobre las aguas caído
La luna baila entre las canoas
Como un duende cuidando el río

Y cuando viene el amanecer
Por esas costas del Uruguay
Ya no hay barcos por las orillas
Hombres y sueños muy lejos van

Son domadores de potros fieros
Los pescadores de mi lugar
Surcando el agua pasan la vida
Siempre vivida buscando el pan

Antiguo oficio de los paisanos
De río, laguna, arroyos y mar
Igual que el pez en la red prendido
Tan solo queda luchar y luchar...

Del Camacuá hasta el río Cuarein
Del Yaguarón hasta el río Queguay
Del San Luís hasta el Río Negro
Del Olimar hasta el Uruguay

Y poco vale la vida, hermano
Si cambia el tiempo sin avisar
Por eso hay que entender los vientos
Y a cada pájaro por su volar

Martim César

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

A memória guardará o que valer a pena. A memória sabe de mim mais que eu; e ela não perde o que merece ser salvo. Eduardo Galeano

Dilema

Para sempre, em duas metades, repartido
Sem saber qual sou eu, dentre essas partes
A racional - feito um discípulo de Descartes
Ou a passional - feito um escravo de cupido?

Seguir a fé, com os seus ritos e estandartes
Sem questionar o porquê de haver nascido
Ou seguir a ciência onde tudo tem sentido
Menos o amor que faz nascer todas as artes?

A eterna dúvida do que sou, guardo comigo
Feito o dilema que consome a minha mente
Ou a resposta que, em vão, busco e persigo

Há dois caminhos a seguir, mas qual eu sigo?
Sou um que pensa e, também, outro que sente
Digo o que sou, mas nunca sou isso que digo!


Martim César

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar. E eu não vou me resignar nunca. Darcy Ribeiro





Atemporal

Não me falem do tempo dos relógios
Exato e cotidiano, perfeito e insensível
Quem saberá o que é o tempo?
Cientistas, físicos, astrônomos?
Eu prefiro o tempo dos poetas
Que se distende pelo plano das palavras
E viaja – sem horários –
Pelos rumos tortos da imaginação.

Não me falem do tempo dos cronômetros
Imutável e monótono, metálico e previsível
Quem saberá o que é o tempo?
Matemáticos, engenheiros, catedráticos?
Prefiro o tempo dos amantes
Eternidade nos momentos de distância
Fugaz como um lampejo
No sonhado encontro de dois corpos.

Não me falem do tempo digital
Provável divisão do que não pode ser dividido
Insensato cálculo do que não pode ser calculado
Cinco ou cinqüenta anos? Agora ou algum dia?
Morremos antes ou depois? Quem saberá?

Não me falem do tempo dos segundos e minutos
Não... eu já disse: não me falem!
Eu prefiro o tempo das crianças
Sem passado e sem futuro.

Não me falem do tempo das horas e dos dias
Não... eu repito: não me falem!
Eu prefiro o tempo dos lunáticos
Início após o fim. Vida inteira a cada dia.

Eis o tempo que eu saúdo: este hoje irrepetível!
Surpreendente em cada esquina.
Volúvel como um céu de tempestade.

Para ele, tão somente para ele,
Ergo a minha taça de ilusão
E me embriago para sempre
no absinto de um poema.



Martim César

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Cantar era buscar o caminho que vai dar no sol/tenho comigo as lembranças do que eu era/para cantar nada era longe,tudo tão bom! F.Brandt/M.Nascimento

Por cinco minutos

Por cinco minutos perdeu-se um amor
A semente na flor já não se abrirá
A menina com pressa que chega ao encontro
O menino que pronto também chegará...

Um amor represado em mil horas de espera
Em miradas furtivas em meio aos demais
Que, assim, deixará de saber-se quimera
Nessas almas em guerra que, enfim, terão paz

Que um pro outro nasceram e, assim, viveriam
Que seriam felizes... não há quem duvide!
Até mesmo os anjos desde há muito sabiam
Testemunhas que eram desse amor tão sublime

Mas não é que o cupido nesse dia adormece...
(O destino tem manhas que ninguém sabe ao certo)
Os arcanjos não vêem - mesmo Deus não percebe -
E se fazem distantes os que estiveram tão perto

Ele jamais descobriu o quanto ela esperou
Ela jamais entendeu do seu atraso a razão
E por cinco minutos perdeu-se um amor
Quase os mesmos minutos... desta canção!!!

Martim César

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Não sou eu quem me navega, quem me navega é o mar... é ele quem me carrega como nem fosse levar. Paulinho da Viola


Domingo, em São Lourenço... no encerramento da Feira do Livro.... um pouco de música e poesia.





Passatempo

Quando falares desse amor
Fala com jeito
Não é direito
Zombar assim da minha dor

Quando falares desse amor
Mantém respeito
Dói no meu peito
Ainda o espinho dessa flor

Não zombarás!
Esse há de ser meu mandamento
Nunca, jamais
Não rias disso um só momento
Deixa-me em paz!
Se eu fui pra ti só passatempo
Que bem te faz
Ferir assim meu sentimento?

Quando falares desse amor
Não aches graça
Pode que faça
Um dia falta meu calor

Quando falares desse amor
Não faz pirraça
Que a vida passa...
E só o que não passa tem valor.

Martim César

e

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Quem ensina, aprende ao ensinar. Quem aprende, ensina ao aprender. Paulo Freire


Hoje temos Musicanto. Com um tema sobre as Missões Jesuíticas. Domingo temos apresentação musical com Ricardo Fragoso, Ro Bjerk, Nando Barcellos, Paulo Timm e eu no encerramento da feira do livro de São Lourenço do Sul. Música e poesia à beira da Lagoa dos Patos. Seguimos na ativa...



Alma além da pedra

Às vezes um canto índio vem templar minha guitarra
Cruzando léguas de tempo para chegar junto a mim
Dobrando sinos antigos, despertando madrugadas
Com voz de bronze clamando por seus povos guaranis!

Então renasço guerreiro, mangrulho de história e tempo
Na velha estirpe ameríndia frente à sanha das bandeiras
E um M’bororé recordado ainda ecoando nos ventos
Lembra a altiva bravura de uma pátria missioneira

Porque eu não sou ruína... estou além da pedra
Raiz com gosto de terra, antiga legenda avá
Meu sangue ancestral revive na mescla
Do ‘gaucho’ que canta nalgum m’baracá

E um rio primitivo de versos deságua
Deixando na alma lampejos de céu
Vertendo em recuerdos o sonho de um tempo
Que ainda resiste no chão de São Miguel.

Quem escuta em silêncio o silvar dos templos vazios
Descobre o dulce idioma das plegárias naturais
Velha magia pombera que habita as margens dos rios
E que veio morar nos sinos dando voz às catedrais!


Martim César




sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Por alguns dias o blog ficará com os poemas esperando para criarem vida... (para manutenção... do blogueiro!)

Feira do livro - Musicanto - Califórnia - e o festival dos campos neutrais (Jerra) nos esperam.

Dia 01 de dezembro estaremos de volta.

Ass.: Os poemas

'Um pedaço de presente, e um pedaço de passado... tudo isso enraizado no subsolo da gente. Jayme Caetano Braun (Ruy Ramos)

Imagem: Leandro Barrios



Temporal de Santa Rosa

Lá fora se apruma o tempo
Temporal de chuva e vento
Carregando a escuridão
Cá dentro o mesmo alvoroço
O mesmo ar de retoço
De saudade e solidão

Minha vó cortava em cruz
Com machado e fé em Deus
Os perigos da tormenta
Minha vó - doce lembrança
Dos meus tempos de criança
Do jardim e da água benta

Os antigos professavam
Fim de agosto : “Santa Rosa”
Vem tropeando seus trovões
Não se cruza os alambrados
Que neles brincam os raios
Partindo ao meio os moirões

Lá fora o céu veio abaixo
E o vento reponta ao tranco
A tropilha do aguaceiro
Cá dentro o peito se acalma
Talvez prá forjar a lágrima
Que vai vir de sinuelo

Naqueles dias - me lembro
Minha mãe tapava espelhos
Com medo desses mandados
Trancava portas e janelas
Pois sendo chuva de pedra
O estrago vinha dobrado

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Canta a tua aldeia e serás universal. Tolstoi

Leandro Barrios

Baixada das lavadeiras

Rumo do centro pras vilas
Bem antes da Ponte Preta
Na rua detrás do asilo
No altar comum das piletas...

Enxugavam ali a pobreza
Entre o sabão e o suor
Lutando pra ter na mesa
O pão de um dia melhor

Bate-que-bate nas tábuas
Espumando os empedrados
Dos banhadais de arrabalde...
Em ti volto a ser menino
Pra enxugar meu destino
De ser cantor de saudades

Baixada das lavadeiras
Memória viva da infância
Hoje tuas vozes me chegam
Cruzando tempo e distância

Baixada das lavadeiras
Tuas águas já não estão
Se foram nas corredeiras
Da história de Jaguarão

No Cerro das Irmandades
Paisano, tire o chapéu
Pois ali mora a saudade
De quem já se foi pro céu

E logo embaixo, nas sangas
Na mormaceira ou no frio
Lavadeiras se arremangam
Nas águas que vão pro rio

Martim César

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Diante da vastidão do tempo e da imensidão do universo, é um imenso prazer dividir um planeta e uma época com você." Carl Sagan






Alquimia

Pela lei dos corpos em movimento
Forças centrífuga e centrípeta
Teu corpo, meu corpo
Exata sincronia

Pela lei da vibração molecular
Dilatação dos líquidos
Meu sangue, teu suor
Alquimia perfeita

Pela lei da gravitação universal
Meteoro no teu mar
Meus olhos, tuas órbitas
Explosão de supernova

Pela lei da relatividade
Espaço-tempo indivisível
Eu em ti, tu em mim
Átimo infinito

Pela lei quântica dos átomos
Indecifrável conceber
Eu contigo, tu comigo
Minha única lei.

Martim César

terça-feira, 16 de novembro de 2010

As falhas dos homens eternizam-se no bronze, / As suas virtudes escrevemos na água. William Shakespeare


Sertão das águas

Arrepare n’água, seu moço
Parece ser tão igual
Mas o seu jeito de poço
Dá bem a cor do seu mal

Eu vô fiando essas rede
Tentando sobrevivê
Olhando o rio, que de sede
Já não faz mais que morrê

Meu pai contava, seu moço
Que em tempos do meu avô
Havia festa... alvoroço
Na volta dos pescadô

Agora as rede se some
Pelas fundeza do rio
E quando voltam os home
Só barco e olhos vazios

Não sei vivê doutro jeito
Sou pescadô de pequeno
De quando as água do leito
Não conheciam veneno

Vejo no olhar do meu filho
A mesma interrogação
Pra quê as rede que eu fio
Se a vida volta mais não?

Martim César

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Corrientes, tres,cuatro, ocho... Y todo a media luz... crepúsculo interior... a media luz los besos,a media luz los dos... (Carlos Lenzi/Carlos Gardel



Bajo aquel farol

Bajo aquel farol
De la vieja esquina
Tus labios de niña
Callaron mi voz
Allí nació el amor
Ese Dios cruel
Que solo una vez
(Tan solo una vez)
Quizás por compasión
Regala su dulzor.

Y fueron tantos días
De ensueño y de ilusión
Y después...
Después se fue la vida
Llegadas y partidas
Mezclando lluvia y sol
Y así perdió el amor
En una despedida
Bajo un farol de esquina
Y ya no fuimos dos.

¡Cómo pasa el tiempo!
Me dijiste ayer
Al volverme a ver
En un casual encuentro
¡Qué fuerte es la corriente!
Después de tantos años
Hoy solo dos extraños
Se miran frente a frente.

Y por última vez
Nos dimos un adiós
Y me alejé de ti...
Mi alma estaba gris
Más gris mi corazón
Y bajo aquel farol
Al fin yo comprendí
Las trampas del amor
Y dije para mi:
(Tan solo para mí)
¡Yo nunca te olvidé!
Martim César


quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Espere sentado, ou você se cansa... está provado: quem espera nunca alcança! Chico Buarque

Artista: Leandro Barrios




Para os que semeiam futuro

É preciso semear a insensata alegria
Quando a dor nos devia amargar a emoção
É preciso a coragem de afirmar o destino
E enfrentar os abismos que nos impõe a razão

É preciso cuidado, que a mão boa não falte
Que a estiagem não mate a colheita do pão
É preciso cuidado, ademais da experiência
É preciso a ciência de saber a estação

Mas acima de tudo é preciso esperança
Esse olhar de criança a pedir nossa mão
E é preciso cuidado... sim!
É preciso cuidado que este tempo nos pede
E a vida é mais breve do que esta canção

Porque somos raiz
Razão da terra nos frutos que vingarão no futuro
Porque somos país
Nação a buscar outros rumos para um tempo mais justo

Seguimos, alma livre e libertária
Nem a morte nos separa desse dia que há de vir
Seguimos, coração feito guitarra
Mãos abertas que preparam um amanhã menos servil.

Martim César

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Vamos celebrar o instante... que o abraço dos amantes justifica o universo.

A balsa

Naquele ônibus
Há muitos anos atrás,
Cruzando pela balsa que cortava caminho
Entre Jaguarão e Rio Grande,
Eu pensava:
Nesse ir e vir eu já havia feito mais de três vezes
a volta no planeta.
Era muita distância percorrida.
Muita...
Mas isso não era o que me impressionava.
O que me admirava,
O que me causava verdadeiro espanto
Era que,
Com todo aquele caminho e tempo já vencidos,
Eu ainda não havia conseguido
me encontrar.



Martim César

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Ah!A poesia... se não me perguntam o que é, eu sei. Se me perguntam: já não sei!

Pontuação

Tenho tudo
(ou quase tudo)
Para ser feliz
Ponto

Quase sou feliz
Reticências

Portanto
Dois pontos

Não sou feliz
Ponto final

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

A coisa mais bela que o homem pode experimentar é o mistério. É essa emoção fundamental que está na raíz de toda ciência e toda arte. Albert Einstein






Para os dias que virão...

Não me peças que eu seja um rio sereno
Desses que eternizam tardes calmas
Minha vida é mar revolto, sol a pleno
Nunca pude dar silêncio à minha alma!

Desde o dia em que abri as minhas asas
Compreendi que buscar rastros era em vão
Quem partiu e depois quis voltar às casas
Só encontrou em seu regresso a solidão

Mas, companheira, quando chegas de mansinho
Nesse rancho onde eu guardei meu coração
Em teus olhos eu encontro o meu caminho
E já não temo mais o frio dos dias que virão

Mas, companheira, no calor do teu carinho
O meu inverno se aconchega em teu verão
E enfim entendo que já não quero ser sozinho
E arrumo o rancho para os dias que virão

Não me peças que eu seja um rio sereno
Igual a esses que enfeitam as paisagens
Minha vida é mar revolto, sol a pleno
Águas rebeldes alargando as suas margens

Quando se tem no coração noites escuras
Vale bem mais a frágil luz de cada estrela
Pequeno ser que a cada passo se pergunta
Que vale a vida... se a vivermos sem vivê-la?


Martim César

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Si piensas volver al pago, no tardes mucho...que el tiempo cambia la vida de tu lugar.




Olhar de pueblo

Cai a tarde sobre as coisas do lugar
Deixa brasas sobre o cerro e sombreia o casario
Segue ao largo o rio menino, a cumprir o seu destino
De eterno peregrino que jamais pode parar
A cidade dorme o seu sono interiorano
Recordando o lume antigo de outras luas
De antes mesmo do seu tempo...
Vai sonhando com jaguares e Charruas
Com guerreiros e índias nuas
Os primeiros habitantes destas matas e aguadas

A cidade dorme o seu sono centenário
Sob o olhar do campanário que embala os casarões
Vai sonhando com a pompa de outras eras
Com metais e com brazões
Com suas damas, seus barões
Seus senhores de escravos e charqueadas
Poucos sabem que a sua história é bem maior
Que essa que ficou nos livros
Ou nos tão pobres motivos dos nobres ricos de agora
Poucos sabem que a sua história é bem maior
E ainda vive nos arquivos
Quase mortos mas tão vivos
Da memória dos avós!

Seu silêncio tem a voz do cantar das lavadeiras
Ou de uma praça de carretas que já não existe mais
Seus rumores são aboios no corredor dos tropeiros
Ou o lamento dos barqueiros na fúria dos temporais
Suas sombras têm fantasmas que ainda guardam ruínas
De uma velha enfermaria, herança dos ancestrais
Que lembra um tempo de guerra
O sangue por sobre a terra
E o alto preço da paz.

A cidade dorme o seu sono quase eterno
Lembra as missas de domingo e suas moças na janela
Seu sotaque fronteiriço traz recuerdos de Castela
Seus portais e suas fachadas, seus adornos e arabescos
Sabe a Mouros na Ibéria e a princesas encantadas
A cidade dorme o seu sono provinciano
Seu futuro previsível independe dos profetas
Mas sua alma adolescente se revela todo dia
No pensar dos seus boêmios, seus cantores e poetas
E o seu povo verdadeiro
dorme num banco de praça.



Martim César

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

A solidão de um amor é uma prisão pelo avesso...estamos fora, libertos, sonhando em estarmos presos.

A una lágrima de rocío

Sé que te irás
Por el camino que una vez
Te trajo a mí
Dejándome
Sólo una lágrima de adiós
En tu partir
Gotas de sal, mi soledad

Te olvidarás
De aquellas tardes de promesa
Y sol de abril
Lejos demás
Aquel pueblito y los paseos
Por su río
Tiempos de sol... nuestro soñar

Pero por más lejos que vayas,
Amor mío,
Jamás te olvides
Que como las aguas
De aquel río
El tiempo pasa

Quizás mañana sea invierno
Y tengas frío
Y al recordarme
Una gota de rocío
Se anide para siempre
En tu mirada


Martim César

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Enterrem meu coração na curva do rio. Dee Brown

Capa do livro: Poemas Ameríndios - escultor: Cléber Carvalho



III - Ruínas de São Miguel

Ruínas, pedra, silêncio
Nas ruas de São Miguel
E esse vazio imenso
Do que já foi, mas não é

Que outra culpa haveria
Além da clara verdade
Que a humanidade podia
Viver, enfim, na igualdade?

Aqui meu canto sem terra
Pra terra voltando vai
Num grito que ainda espera
Por ver os homens iguais

Onde estão teus Karaís?
Teus Tuxavas onde estão?
Trinta povos Guaranis
E é tão só uma a extinção

Algum sino imaginário
Num futuro alvorecer
Dobrará nos campanários
Por quem morreu por viver


............................................

Karaís – Profetas guaranis aceitos pelas aldeias que se enfrentavam
entre si na permanente busca da Terra sem males.
Tuxavas – Caciques guaranis.









quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Dale tu mano al indio, dale que te hará bien... y encontrarás el camino, como ayer yo lo encontré. Daniel Viglietti






II - Terra Sepé Guarani

No princípio, a resistência
Depois a fé e a cruz
Pois é Tupã, na essência
O Deus que a todos conduz

Em meio a sete cidades
Nasceu um facho de luz
E um nome que a liberdade
Chamou Sepé Tiarajú

Que sabias de Tratados
De Lisboa ou de Madrid?
Sabias do amor sagrado
Ao teu chão guarani

Da tranqueira do Rio Pardo
À estância do Yapejú
Ouviu-se o teu livre brado
José Sepé Tiarajú

Teu canto... um grito de guerra
Que ainda clama por paz
No sonho da própria terra
De ver os homens iguais

Alçou-se toda a campanha
Com teus Tapes Missioneiros
Os mesmos que à madre Espanha
Serviram como guerreiros

Contra o arcabuz e o canhão
Não pôde o valor e a fé
Mas não morreram em vão
Os mártires de Caiboaté

Onde houver povo sem chão
Sem liberdade, onde houver
Com eles sempre estarão
Mil e quinhentos Sepés

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Mas será que esta América não é mesmo Índia....









Por ocasião dos 250 anos da morte de Sepé (Em uma homenagem em forma de trilogia que fizemos para uma apresentação em São Gabriel, no local onde caiu o índio Tape Missioneiro).



I – Um sino acorda as Missões

Era o Uruguay, o rio-mar
A pampa, o sol... era a lua
Era o conviver milenar
Minuanos, Tapes, Charruas

Teu mundo era a liberdade
A natureza... a inocência
Depois chegaram os padres
Com suas preces e crenças

Nasceram trinta cidades
Sob os desígnios da cruz
Tupãbaé e a igualdade
Mais de um século de luz

Vem, hermano, ouve comigo
Este sino imaginário
Dessa manhã que por ‘siglos’
Acordou nos campanários

Mas não te esqueças... jamais!
Embora vá longe o tempo
Podemos, sim, ser iguais
Nos guaranis, o exemplo!

Ainda viva na memória
A infâmia das bandeiras
Ensangüentando na história
A tua terra missioneira

Mas expulsaste o invasor
Caazapa-Guazú, Bororé
Neenguirú, corregedor
De estirpe igual a Sepé

Nasceram trinta cidades
Sob os desígnios da cruz
Tupãbaé e a igualdade
Mais de um século de luz


.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

O poeta é um fingidor. Finge tanto, e tão completamente, que finge que é trabalho, a poesia que faz durante o expediente. Jorge Missaggia






Disfarce

Morre a poesia...
Como haveria de sobreviver?
Em meio a carimbos e notas de expediente,
Calculadoras e prendedores de papel.
Envolta em artigos cotidianos,
Hierárquicas convenções.

Morre a poesia...
Como haveria de sobreviver?
Consumida por horários e legislações,
Normas e registros burocráticos.
Asfixiada por ruídos de impressão,
Estalos de máquinas copiadoras.

Morre a poesia...
Em uma folha amassada
Suicidada na lixeira do escritório.

Mas a poesia...
- a dissimulada e eterna poesia –
De uma gaveta entreaberta,
Desde um livro do Quintana,
Pisca o olho e me sorri.
Depois pede que guarde seu segredo,
E faz que morre novamente.

Martim César

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

A tentação mais perigosa: não se parecer com nada. Albert Camus



De uma antiga rebeldia

Parado aqui
Olhando a estrada passar por mim
Eu não entendo porque a vida mudou assim
Aquele olhar de rebeldia, que tive um dia, já não é meu
Talvez meu filho resgate o brilho que se perdeu


Que valem agora as velhas poesias
Que amarelam escondidas nas gavetas do meu quarto
E aquele sorriso, quase triste, que ainda insiste
na moldura do retrato?

Parado aqui
Olhando a estrada passar por mim...

Que valem agora tantos planos
Tantos enganos cometidos sobre o bronze
Que ninguém mais pode mudar?
Que valem agora meus milhares de motivos
Já esquecidos sob a poeira destes anos?
Se na verdade eu me perdi...
Eu descobri que na vida jamais se pode parar.

Parado aqui
Olhando a estrada passar por mim
Eu não entendo porque a vida mudou assim
Aquele olhar de rebeldia, que tive um dia, já não é meu
Talvez meu filho resgate o brilho que se perdeu

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

!Los gustos hay que hacerselos en vida!

(A Chiche y Sabalero, dos boemios uruguayos, tangos y candombes van con ustedes, recuerdos y nostalgias quedan con nosotros)

Pequenos apontes sobre a saudade

Frágil teia que se rompe sem se ver
Sem que ninguém saiba a hora e o lugar
De repente chega o anoitecer
E a manhã de sol que já não mais virá

Restam fotos de saudade nas paredes
E na rede só o vento a se embalar
Restam ruas sem o ressoar dos passos
E os abraços que não pode mais se dar

Uma voz que se erguia em rebeldia
Se rendeu às armadilhas do silêncio
Um sorriso em que cabia toda a paz
Não é mais que lembrança de momento
Um olhar que incendiava o sol
É farol que se apagou em nosso tempo

Que fronteira que se cruza num segundo
E nos deixa sempre o mundo mais vazio
Que universo que o verso não alcança
Que distância que só vence quem partiu!

Há um rastro dessa ausência nas canções
E mil razões que não têm como explicar
Há um nome que a saudade sempre lembra
E um poema que ainda espera o seu final!


Martim César

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Que el tamboril se olvida y la miseria no! El Sabalero

La Casa Encantada fue incluida como material de estudio en las escuelas primarias de Uruguay. "Y para mí eso es como tocar el cielo con las manos, ese es el reconocimiento de un artista popular, estar en los programas escolares", confesará sin ocultar la emoción.
José se fue al exílio, como tantos latinoamericanos en el tiempo que la persecución política y las desapariciones eran el pasto en la tierra del terror. De su paso por Holanda asegura que "uno nace un poco de nuevo cuando está en un lugar en el que no sabe hablar". En el extranjero hizo de albañil, volantero, cosedor de cueros y cantaba en actos solidarios con los presos. "En el exilio perdés las seguridades de lo que tenías a tu lado", dice a lo que agrega "pero ganás en conocer otros lugares y en tus posibilidades de saltar paredones".
"Nosotros fuimos parte de un movimiento sin darnos cuenta", explica El Sabalero, el movimiento popular en el que se inscribieron tantos cantores "no son inventos", señala a lo que recuerda que "empezábamos a cantar en lenguaje de entre casa, éramos muchachos con una fuerte pertenencia a la clase obrera. Uruguay tuvo un movimiento sindical muy fuerte y sano. Y tuvimos la suerte de nacer en ese medio y la sociedad uruguaya se movía en derredor de ese movimiento sindical. El pantalón cortito de Chiquillada es de clase", concluye categórico.

En una sociedad económicamente ahogada, culturalmente vaciada y políticamente colonizada, El Sabalero asume el mundo en que sobreviven sus personajes, que es uno de los más concretos y poéticos. Fácil es situarlo geográficamente, Villa Pancha puede estar acá cerquita. Cargados de particularidades sus personajes y sus barrios son universales. Carbajal es un gran narrador que, ajeno a la maquinaria de la moda rastrea las sombras de la memoria y retrata las raices de su pueblo, ahí reside la magia y la vigencia de su arte.

Nueva Radio

Pantalón cortito, bolsita de los recuerdos...pantalón cortito con un solo tirador. El Sabalero


Não há palavras para expressar a alma grande desse poeta de 'cosas chiquitas'. O Uruguay e nós, os da resistência silenciosa e boêmia, perdemos uma parte insubstituível de poesia e sabedoria mundana. Ninguém retratou melhor a Montevideo carnavalera e o Uruguay dos Pueblitos, essas pequenas cidades de uma rua só, que parecem estar sempre na hora da 'siesta'. Ninguém contou melhor sobre os 'gurizes' dos arrabaldes. Ninguém, em melodias simples e belas, registrou tão magistralmente os pequenos - mas tão imensos - momentos das cidadezinhas esquecidas desta parte do mundo.
Quando retomamos o Canto do Jaguar, um festival que havia sido realizado nos anos 90 e já estava tomando ares de lenda, pensamos em um ícone da música del paisito hermano. Pensamos no autor de 'Chiquillada, Borracho pero con flores, A mi gente, la sencillita, pa'l abrojal e tantas outras canções' para fazer o encerramento da noite de sábado. Era um antigo sonho. Difícil de realizar, já que o Sabalero estava, na maior parte do tempo, na Holanda, onde tinha família. Mas tivemos sorte e ele se mostrou entusiasmado com o convite. Tanto foi que veio um mês antes para conhecer o lugar onde seria a apresentação e nos disse que era a primeira vez que atuaria no Brasil. E assim foi. Inesquecível. Desfilou seus candombes e sua poesia cantada em duas horas de sintonia com público. Caminhou entre as pessoas, em pleno Largo das Bandeiras. Essa imagem ficará gravada para sempre na minha memória. Depois da apresentação, após atender a todos os que quiseram tirar fotografias com ele, seguiu conosco para jantar. E a primeira frase que disse para o pessoal do seu grupo, ao vê-los reunidos em uma mesa, foi: 'Eh! Muchachos... mezclensé con la gente... la música sirve para eso... para la integración de hermanos'.
Salve, Sabalero.... tu casa encantada estará para siempre en la memória de tu pueblo y de cada gurí arrabalero.
..............................................................................
Borracho, pero con flores vuelvo
borracho, pero de sueños ando
entran a sonar las lonjas
y me salen del profundo
batuquear carnavalero
todas las tardes del mundo.
Que sera Montevideo
tan querido y tan lejano
que sera de sus comparsas
y toditos mis hermanos.
Que sera Montevideo
tan lejano y tan querido
de esta barra volvedora
sos la fija de camino.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Os navios estão a salvo nos portos, mas não foi para ficar ancorados que eles foram criados. (Anônimo).

Puro sentimento

Como o sol que precisa do olhar
E o olhar que precisa do amor
É o amor quem nos leva a cantar
Mergulhar nesse rio, como for

Esse frio de emoção que há em nós
Quando se abre a cortina da vida
Dá sentido aos caminhos da voz
Faz brilhar nossa luz mais sentida

Leve chama que inflama o universo
No mistério do que ainda virá...
Qualquer vida é maior do que um verso
Mas quem pode viver sem sonhar?

O menino olha as águas do rio
E a vontade, afinal, vence o medo
Tão pequeno parece o seu desafio
E, no entanto, esse é o grande segredo.

Martim César

terça-feira, 19 de outubro de 2010

E se tu olhares, durante muito tempo, para um abismo, o abismo também olha para dentro de ti. F. Nietzsche





Ponto de inflexão

Ali estava eu, em plena curva descendente
No rumo sul (eu que jamais tivera um norte)
Já sabendo, meu amor, qual a minha sorte
Pois ninguém cai e segue, assim, eternamente

Chegaria o final, em algum solo, de repente
Ainda que isso – nessas horas – pouco importe
(O que mata, na verdade, é a caída, não a morte
E o que nos trai não é o abismo e sim a mente!)

Ali estava eu, quase chegando, assim, ao chão
Sendo mais um, na hora comum de uma partida
Sem levar malas (que não permite essa estação)

Quando uma voz pediu: ‘adia a tua despedida
Que eu tenho em mim teu ponto, enfim, de inflexão...’
Deu-me asas e cá estou eu (valha-me Deus!)
............................................................noutra subida!!!

Martim César

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Haja hoje para tanto ontem! Paulo Leminsky

Arma nuclear

Pasmem!
Ontem morreu no Japão
O único ser humano
Que sobreviveu a duas bombas atômicas.

Morreu de velhice!

Isto quer dizer que o tempo,
Essa grandeza invisível...
quase imperceptível
de tão sutil,
É infinitamente mais potente
(mais letal!)
do que a mais potente
das mais potentes
armas nucleares
........................................inventada pelo homem!

Martim César

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Os bares mudam... mas os boêmios são sempre os mesmos.

Entre charlas e poemas

Eu faço minha poesia
Feito quem busca pros dias
Estrelas da noite imensa
Assim encontro sentido
A este ser dividido
Entre o que é e o que pensa

Escrevo em qualquer papel
As frases desse mundéu
Onde enredei meu viver
Assim as horas mais vãs
São como o sol das manhãs
Que tudo invade ao nascer

De mim, restará o que digo
Numa canção ou num livro
Nalguma história de amor...
Mas não me creiam deveras
Minha verdade mais séria
É o meu olhar sonhador

O universo que eu toco
Em meio a charlas e copos
Nas minhas noites insones
É essa luz que me ensina
Que a chama que me ilumina
Também me queima e consome

Andar... eu ando e andando
Eu vejo o mundo rodando
E nele eu sigo, à deriva
Cumprindo o eterno dilema:
Saber que o maior poema
É sempre menor que a vida!

Martim César

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

E no meio de um inverno eu finalmente descobri que havia em mim um verão invencível. Albert Camus

Em ordem

Do telhado da casa vizinha um gato me olha
e é o único sinal de vida
nessa tarde monótona.

Que fazer para romper o tédio?
(Creio que o gato também não sabe,
mas isso, convenhamos,
não é um consolo)

Que fazer para interromper essa imensa
sucessão de nadas
sucedendo nadas
que ficaram?

Abro as gavetas. Folheio velhos papéis...
Quanto tempo guardado inutilmente!
Quanta vida represada em águas
que já não tem
mais força alguma!

Há milênios que partiste
e eu ainda continuo aqui...
Esperando que venhas colocar
as minhas gavetas,
os meus papéis
e a minha vida
........................................em ordem.


Martim César

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Los tambores transmiten la buena nueva. Los invasores no son inmortales. Eduardo Galeano




Descobertas

E eis que Colombo,
depois de mil
peripécias
Veio a descobrir
a América...


Grande feito??!!

Ora!
Era bem mais fácil perguntar
A qualquer um dos seus milhões
de habitantes
Onde ela ficava.



Martim César

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons. Martin Luther King



Caminho sem volta

Quando ele partiu do seu lugarejo,
Tinha o grande sonho de vencer na vida...
Levava a esperança nos braços de moço,
Deixava o seu mundo nessa despedida.

Levava nos bolsos, além de uns trocados,
O rosto da amada na fotografia...
Deixava um adeus num beijo salgado
E a jura sagrada de que voltaria.

Mas na grande cidade a vida é difícil...
Não sorri a fortuna para qualquer um!
O dinheiro acaba, não há onde morar,
Restam as favelas ou lugar nenhum.

Conheceu o inferno mas sobreviveu,
Pois quem é esperto sempre se dá bem...
Conhecido no morro, temido no asfalto,
Numa arma o poder e, enfim, era alguém!

Pensava em voltar mas não era tão fácil,
Quem joga esse jogo não sai sem perder!
E o caminho de volta se fez tão distante,
O destino jogava as suas cartas também...

Quando a polícia estourou o seu ponto,
Houve algumas mortes, coisa tão normal...
Morreu um traficante que era só um menino,
Tão jovem ainda e já um marginal!

Tornou-se famoso como sempre quis.
Seu rosto estampado em todos os jornais...
Até mesmo no diário do seu lugarejo,
Quem viveu na guerra hoje dorme em paz!

Quase ninguém viu no calor da tragédia
Que ao lado do corpo uma passagem havia
E, junto a ela, sorrindo, um rosto de menina
Manchado de sangue na fotografia!!!

Martim César

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

El poema no muere por haber vivido, está hecho expresamente para renacer de sus cenizas y volver a ser infinitamente lo que acaba de ser. Paul Valéry

Os óculos de Allende

Os sapatos que restaram em Auschwitz
são parecidos aos que uso
todos os dias,
Mas não são iguais.

Os óculos de Allende sobre uma mesa
em la Moneda,
são parecidos aos meus,
Mas não são iguais.

A risada de Carlitos mostrando um mundo
de palhaços e crianças,
- não de tiranos e amargurados -
é parecida à minha,
Mas não é igual.

Já o teu sonho pequeno...
(quase insignificante, talvez)
de ser feliz - apesar de tudo -
sem infelicidades alheias,

Esse não é parecido ao meu...

é exatamente igual!


Martim César

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

"Aprender a dudar es aprender a pensar" . Octavio Paz

Pedra da palavra

Palavra em pedra
Para ser lapidada
A pedra
Para ser polida
(Ou rolada
como a Terra)
A palavra
Para gregos e troianos
Feito flechas
Com poemas mais humanos
Lançados pelos deuses
Por engano.

Para escravos e tiranos
Do amor
(O verdadeiro Deus)
Sempre um engano!
Por Zeus!
Há tantos planos...
Mas a pedra
do tempo
No vento
É palavra que se gasta
E basta!
Já mudamos.

Fronteiras
De Charruas e Minuanos
(Ou será
de Apaches e Moicanos?)
Boleadeiras
E pedras nos machados
E por que não escalpos?
Sim!
Escalpos!
(Que outra palavra haveria?)
Não se esqueçam dos escalpos!
Dessa gente
Para que se abram as mentes
E enfim...
A pedra faça entrar
(Quem diria?!)
A pedra faça entrar
a poesia!


Martim César

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Amigo é coisa para se guardar do lado esquerdo peito, dentro do coração. Mesmo que o tempo e a distância digam não. M.Nascimento/F.Brandt



Carlitos Noble,

el de la amistad, el de la utopía, el del vino, el de la murga...

(Fotografia: Hélio Ramirez)

A un murguista del Sur

Un viejo murguista, señor de las calles del pueblo
Que en los carnavales siempre era el primero...
Carlitos el noble, luciendo su cara pintada
Con su voz de trueno cantando en las madrugadas.

Un Quijote del Sur que nos daba su tierna mirada
Y aunque hablaba muy poco, mucha cosa contaba
De esta parte del mundo, de lo que fue nuestra historia
De los años de lucha... ¡dolor, sueño, memoria!


Carlitos el noble... ¡un arlequín de frontera!
Sembrador de un mundo sin color de banderas
Una copa de vino hoy levanto a tu vida...
Y a tu sueño, mi hermano, de una América unida!

Los tamboriles lloran la ausencia del viejo murguista
Y cuando canta la murga se dicen ‘¡parece mentira!
Pero tal vez por ser pícaro... solo está disfrazado
Y ahí nomás va a subir otra vez pal’ tablado.

Hoy en la murga hace falta una cara pintada
Y en los boliches del pueblo no se escucha un amigo
Pero en el Sur de América ha quedado su alma...
¡Pues en la voz de tu gente no tendrás nunca olvido!

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Pras bandas do poente ergueu-se uma barra e um som diferente ponteou de guitarra... Jaime Caetano Braun

O espelho das sangas

Um sol maragato
Se timbrou na tarde
Brasa se apagando
Mas que ainda arde

Bombeio a paisagem
Lembrando nós dois
Mas várzeas de saudade
Não engordam bois

Desde que partiste
Chegou a estiagem
Minha alma triste
É como a paisagem...

E alguma lágrima
Me molhando às vezes
Lembra que nos campos
Já não chove há meses

Mas se tu voltares
Minha linda, eu juro
Choverá a cântaros
Neste fim de mundo

E as sangas que secaram
De sede e saudade
Ganharão os pastos
Só pra ver tua imagem

E as sangas que secaram
Romperão suas margens
Espelhando a volta
Da felicidade.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons. Martin Luther King

Feito uma gota sobre o mar

De onde vem este meu jeito contrafeito de cantar
Coisas que, às vezes, é melhor deixar ficar?
De onde vem este meu modo
de tentar mudar o mundo
Se lá no fundo eu já sei que não vai dar?

Talvez de quem não tem nem voz para reclamar
Do pão, do chão, do não, do nada,
Do sangue derramado pela paga de algum troco,
Do olhar cansado, vergado,
De quem trabalha tanto por tão pouco.

De onde vem essa ilusão que vive em mim?
Essa esperança que não quer mais esperar,
De achar que, enfim, o não é sim, o meio é fim,
E já não basta esse sonhar?

Talvez de quem sabe tão bem o que é penar...
Talvez de quem sabe tão bem o que é penar...
Da cor, da dor, do suor, da lida,
Das feras que criamos pelas calçadas da fome,
Das vidas desvalidas, perdidas,
Almas de bicho em corpo de homem.

De onde vem...?
Talvez de quem já se cansou de só estar
Feito uma gota a chover por sobre o mar.

Martim César

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Meu primeiro livro...

Fotografia de Alencar Coelho sobre tótem 'Sangre Ameríndia' do escultor Cléber Carvalho

Quando os índios invadiram a Europa

Quando os índios invadiram a Europa
“- Como ousavam?”- Se indagaram os brancos reis
Se não tinham mais que armas antiquadas
Se em seus barcos não cabiam mais que três
Se nem sabiam que o dinheiro era preciso
Se não se guiavam nem por regras, nem por leis
Se não exploravam nem o solo, nem os rios
Se não falavam nem o básico de inglês
..............................................................................
Quando os índios invadiram a Europa
Todos riram: padres, nobres e plebeus
Se esses loucos não sabiam nem guerrear
E se o faziam, não lutavam por um Deus
Se só comiam o que a terra oferecia
Se não cercavam os domínios que eram seus
Se não sabiam transformar a natureza
Como podiam comparar-se aos Europeus?
..............................................................................
Mas eles tinham seus poderes invisíveis
E foram, aos poucos, destruindo as cidades
Plantando árvores no lugar dos edifícios
Desnudando as pessoas, chocando a sociedade
Criando um novo mundo onde todos eram livres
E em cada voz só se escutava uma verdade
Onde não havia nem mais ricos, nem mais pobres
Onde se viu o que era, enfim, a igualdade
..............................................................................
Sim, eles tinham seus poderes misteriosos
Seus espíritos da floresta, seus remédios naturais
Os conselhos dos mais velhos, a coragem dos seus bravos
E essa força sobre-humana dos que lutam pela paz
E desde então já não se pôde destruir por destruir
Já não se pôde exterminar ou enjaular os animais
Já não se pôde poluir o céu e as águas
E a terra fez-se pura como há muito tempo atrás
...............................................................................
Quando os índios invadiram a Europa
Já não mais se soube o que era lucro ou prejuízo
Pois a prata e o ouro só lhes serviam como enfeites
E o dinheiro, estranhamente, nunca mais se fez preciso
Agora, depois que os índios invadiram a Europa
Os senhores do mundo já não zombam com seus risos
E a vida corre, livre e bela, sem ter pressa
Pois desde então estamos aqui:
........................................................... no paraíso!

Martim César
(poema vencedor do concurso Rua dos Cataventos, da sociedade Mario Quintana de poesia)

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Sou o dono dos tesouros perdidos no fundo do mar.Só o que está perdido é nosso para sempre. Mário Quintana

Dos dias que não vivemos
-
Como me buscam hoje os dias que não vivemos
As horas que não tivemos e não teremos jamais
As tardes não compartidas às margens calmas do rio
Ou num lugar só pra dois, na areia diante do mar

Como me encontram hoje a voz de certas canções
O sol de antigos verões que ainda guardo no olhar
E o teu sorriso de aurora que insiste dentro de mim
Como se pudesse assim já nunca mais se apagar

Nunca te esqueças, meu amor, nunca te esqueças
Ainda que lembrares, muitas vezes já não possas
De um sol de inverno que ainda resiste nos poemas
E daquelas tardes que para sempre serão nossas

Nunca te esqueças, por favor, nunca te esqueças
Que fomos muito, e que feito crianças aprendemos
E que hoje só sentimos - já distante o nosso tempo -
A saudade dos dias, meu amor... que não vivemos!

Martim César

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Mas onde se deve procurar a liberdade é nos sentimentos. Esses é que são a essência viva da alma. J. Goethe

Duas aves brancas


Duas aves brancas
Fugindo do frio
Cortam a distancia
Das águas do rio

E não há fronteiras
Para o seu voar
O céu não tem dono
Nem nunca terá

Cá embaixo os homens
Erguem suas grades
Quanto mais concreto
Menos liberdade

Correm contra o tempo
Querem sempre mais
Mas suas riquezas
Não compram a paz

Duas aves brancas
No azul do céu
Não pedem permiso
Vivem sem papel

Se um homem fosse
Toda a humanidade
Só assim seria
Igual a essas aves!!!

terça-feira, 28 de setembro de 2010




Duas premiações pelo 'Poeta e a folha vazia'. (Seara-Carazinho-26/09/2010).
Nada mal.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Aprende, como uma das tuas primeiras obrigações, a dominar-te a ti mesmo." Pitágoras









O poeta e a folha vazia

Mais vale o silêncio triste
De uma dolente melodia
Que esse duelo que existe:
Do poeta e a folha vazia

A alma busca a palavra
Enquanto o segundo escoa
Porém a mente é escrava
Da asa que já não voa

E não existe agonia breve
Na solidão dessa arena
Se o que falta a quem escreve
Não é o tinteiro ou a pena

Pois nessa guerra interior
Sem testemunha ou lamento
O homem esconde a dor
Que lhe devora por dentro

Em frente à folha vazia
(Como um cantor já sem voz)
Compreende - por ironia -
É ele o seu próprio algoz

A porta que leva à entrada
Jamais conduz à saída
Pois onde o rio serpenteava
Restou um deserto sem vida

A flecha outrora certeira
Não mais encontra o alvo
Se quem naufraga é o poema
Como o poeta ser salvo?

Martim César

sábado, 25 de setembro de 2010

Gota de orvalho na coroa dum lírio: jóia do tempo! Érico Veríssimo





As linhas do tempo

As mãos da tecelã forjam o tempo
A roca das manhãs em movimento
Na reta dessas lãs, rumos no vento
Província de São Pedro, o continente

Pedala nos atalhos da lembrança
No casario antigo de uma estância
A avó que embalou a minha infância
E um mundo que se foi já para sempre

Fia fiando a fiandeira nessa imagem
De Bibiana relembrando com saudade
O Capitão que nunca mais irá voltar

Roda rodando vai a roca enovelando
Os dias que são quadros de recuerdos
Que o tempo e o vento já não podem apagar

As mãos da tecelã ditam canções
Mulheres que se foram, gerações
Distintas vidas e as mesmas ilusões
Que seus homens não pereçam noutra guerra

Ficaram elas a alumiar noites escuras
Com suas linhas, seus teares, benzeduras
Com seus filhos, suas rocas, com suas juras
Para que os homens tenham paz sobre esta terra!


Martim César


sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Quando amas alguém e sabes que ele está pronto para aprender e crescer, tu o deixas em liberdade. Richard Bach








Pondo de lado

Pondo de lado tantos dias mortos,
Tantos fantasmas que ainda vagam pela casa,
Tantos papéis amarelados que restam de nós dois...
Pondo de lado tantas horas gastas,
Tantas fotografias vegetando nas gavetas,
Tantos momentos empoeirados...
Pondo de lado o que fomos e o que não pudemos ser,
Somos estes que continuam caminhando
Um pouco mais cansados, um pouco mais serenos.
Menos revoltosos ante os obstáculos,
Menos sonhadores ante os desafios.
Somos estes que navegam seus destinos
Buscando achar o norte sem desesperar-se
A cada nuvem que ameaça no horizonte
Ou ao ver que a nossa bússola
há muito tempo enlouqueceu.


Martim César

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Todo segredo da alma de um escritor, toda a experiência de sua vida, toda a qualidade de sua mente está melhor escrita em seus trabalhos.Virgina Woolf





A chave

Disse um amigo
Em noite de filosofia borgiana
Entre copos repletos de ausência:
“Temos a chave, mas onde estará a porta?”

Pensei em algo inquietante:
E se a chave abrisse a porta de uma casa
Em uma cidade qualquer?

Que misterioso mundo haveria
Do outro lado?
Que vida não vivida
Eu deixei nesse lugar?

De repente eu estava caminhando
Em direção a esse destino incerto.

Vislumbrei a rua, a quadra, a casa...
A desafiante porta. A fechadura.

O garçom me perguntou algo.
Não entendi. Mais uma?

Ah! Sim...
Olhei para as minhas mãos vazias.
Diacho!
Havia jogado a chave fora.

Martim César

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A pesar del tiempo,mi sed de amor no tiene fin;con el cabello gris me acerco a los rosales del jardín.Juventud,divino tesoro,ya te vas para no volver.


Ruben Darío







La lluvia no viene sola

La lluvia hace ríos en mi ventana
Y anochece la mañana
Que había en mi mirar
Y me trae desde muy lejos
viejas imágenes
Que me hacen volver
A mi mundo de ayer
Que me hacen volar
Al rincón donde está
Jugando feliz mi niñez

Una casa vieja, un patio pequeño
Algunos gorriones, un gato y un perro
Todavía están en ese lugar
Un jardín florido y una voz que llama
El campito del barrio y una voz que llama
¡Niño! ¡Vuelve a tu hogar!

La lluvia ya se va, pero aún está aquí
Golpeando dentro de mí
Gotas de una extraña soledad
Y me trae desde muy lejos
viejas imágenes
Que me hacen volver
A mi mundo de ayer
Que me hacen volar
Al rincón donde está
Jugando feliz mi niñez

Un niño que corre alzando su cometa
Un caballo de palo y una bicicleta
Todavía están en ese lugar
El campito del barrio y una voz que llama
Aquel niño que un día se fue de casa
Y hoy ya no puede regresar!


Martim César

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Volverán las oscuras golondrinas en tu balcón sus nidos a colgar... pero aquellas que aprendieron nuestros nombres, esas... ¡no volverán! G.A.Becquer








Máscaras

O amor é um ator de muitas faces
Que não distingue dentre elas a real
Que de tanto encenar seus mil disfarces
Seu próprio rosto lhe parece artificial

Qual fosse um rei que a todos governasse
Ditando regras mais além do bem e do mal
O amor que morre é o mesmo amor que nasce
Muda o cenário mas o enredo é sempre igual

Quem intenta governá-lo seu escravo se revela
Quem o vê na liberdade se descobre em sua cela
Quem o quer sob seu jugo morrerá seu prisioneiro

E, no entanto, quem poderia evitar sua investida?
Se, afinal, é o amor qual um ator na própria vida:
Esconde a face... sob o seu rosto verdadeiro!

Martim César

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

O estudo da metafísica consiste em procurar, num quarto escuro, um gato preto que não está lá. Voltaire





O tempo

Dorme o tempo nos retratos
E desperta nos espelhos
Com seus punhais afiados
Desfaz o fio dos novelos

Prende o lume, tece a rede
Nunca nos mostra seu jogo
Nos desertos traz a sede
No calor engendra o fogo

Faz ser vã toda a riqueza
Ninguém engana o destino
Só nos deixa uma certeza
A de que um dia partimos

Perecem nos nossos olhos
Palácios, terras e templos...
O homem faz os relógios
Mas jamais domina o tempo!

Dorme o tempo nos retratos
E desperta nos espelhos
Deixa saudade nos quartos
Apaga o sol em silêncio

Corta o gume, tinge a cor
Bebe da uva o seu vinho
Do amor oferece a flor
Depois nos deixa os espinhos!

Martim César

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Maldigo la poesía concebida como un lujo cultural por los neutrales que, lavándose las manos, se desentienden y evaden. Gabriel Celaya

Foto: Alan Otto Redu



Tempos e templos

Ó mãe...
Eu vi uma criança carregando outra
E juro não entendo tanta vida solta
É tanta religião e tá faltando Deus

Ó mãe...
Imaginei a vida um pouco diferente
A gente era, enfim, igual a toda gente
A fome uma palavra que o mundo esqueceu.

Ó mãe...
Me explica o que não cabe no meu pensamento
Pessoas mais pessoas rezando nos templos
Mas fora, na calçada, lavam suas mãos.

Ó mãe...
Eu sei que talvez seja só um desvario
Mas já não me emocionam discursos vazios...
Que mostrem em seus atos se são mesmo cristãos!

Ó mãe...
Não venham que é mais fácil seguir a corrente
Por algo o ser humano tem na sua mente
A força de escolher o destino a seguir.

Ó mãe...
Despertar não é o mesmo que estar desperto!
Há tantos que não vêem de olhos abertos
Que pode somar mais quem sabe dividir.

“Ó mãe...
Eu vi uma criança carregando outra
E juro não entendo tanta vida solta
É tanta religião e tá faltando Deus”

Martim César

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Minha vida é um quebra-cabeça
Onde sempre está faltando alguma peça...
Sempre que tento montá-lo,
A peça que falta... já não é a mesma!

Martim César

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Es tan corto el amor y tan largo el olvido. Pablo Neruda

Partilha

Fica
Esse pouco de tempo que resta
Essas taças lembrando da festa
Que um dia já foi nosso amor

Levo
Essa chama de vida tão frágil
Os destroços velando o naufrágio
Depois que a tormenta passou

Fica
Pelos cantos minha juventude
A incerteza de fazer o que pude
Que é bem menos do que merecias

Levo
Teu sorriso mais além dos retratos
Essa peça em seu último ato
Sem aplausos na sala vazia

Fica
Tanto tempo de chão partilhado
Tanto plano pra ser conquistado
E que aos poucos deixamos pra trás

Levo
A memória dos antigos abraços
O apoio comum nos percalços
O olhar cúmplice em meio aos demais

Mas não fica
O sol da alegria que eu tinha
Se tua mão se agarrasse na minha
Que isso eu quero pra sempre comigo

Mas não levo
Tuas palavras falando de adeus
Pois prefiro lembrar que eram meus
Teu olhar, tua voz, teu abrigo...

Mas não fica
Essa chuva que inundou as retinas
Por que a vida ao passar nos ensina
Que o sol há de sempre voltar

Mas não levo
Nada mais do que alguma saudade
E a certeza que às vezes me invade
Que era amor e eu não soube cuidar

Martim César

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Dos mil comerían por un año con lo que cuesta un minuto militar. Leon Gieco

As mãos deste país

Nessas mãos rudes do barro, calejadas da capina
Da colheita que ensina que o trabalho ainda compensa
Nessas mãos que cumprimentam com vigor a um companheiro
Na franqueza do obreiro que constrói o seu lugar

Nessas mãos duras da lida, preparando a vida
Sulcando lavouras...
Vai nascendo a semente que brotando gera
No ventre da terra a estação vindoura

Nessas mãos sangra o suor que enriquece o solo
Madurando o sol que ainda está por vir
Nessas mãos marcadas de lama e salitre
De sonhos rurais, de seiva e raiz...

É nessas mãos caladas, mãos abandonadas
Que germina a paz, pois nelas se faz
este meu país!

Nessas mãos quarteadas de enfrentar geadas
Brandindo a enxada, plantando o futuro
Nessas mãos sofridas, ilhadas, escondidas
Trabalhando quietas na imensidão...

É nessas mãos humildes dessa gente simples
Que ainda resiste a força do meu chão!
Martim César

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Para mim, a televisão é muito instrutiva. Quando alguém a liga, corro à estante e pego um bom livro. [ Groucho Marx ]

Da morte venho nascendo

Da morte venho nascendo
Cruzando a estrada do avesso
Feito quem vivesse o tempo
Desde o fim até o começo

E nessa estranha jornada
Caio do solo até o céu
A cabeça sob o sapato
Os pés calçando o chapéu

E se me chamam de louco
Por pensar viver assim
Eu sorrio e faço pouco
De quem faz pouco de mim

Da morte venho nascendo
Nadando contra a corrente
Como se pudesse o rio
Vir da foz até a nascente

Se ontem será meu futuro
Meu amanhã já passou
Então serei quem eu fui
Sabendo já quem eu sou

Velho, menino, ninguém
História escrita e apagada
Dentro do ventre e além
Tudo voltando a ser nada

Martim César