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segunda-feira, 25 de abril de 2011

Na história da humanidade (e dos animais também) aqueles que aprenderam a colaborar e improvisar foram os que prevaleceram. Charles Darwin



O fogo e a escuridão


Desde tempos imemoriais, venho.
Desde terras remotas repletas de espessos bosques,
Desde rios caudalosos e úmidas florestas,
Desde noites salpicadas de estrelas e galáxias,
Desde mares revoltos circundados por penhascos
inexpugnáveis,

Desde silêncios intercalados por cantigas naturais,
venho.
Eras glaciais habitam em mim.
Milhões de dias e noites habitam em mim,
Com as suas feras e os seus mistérios,
Com as suas luzes e as suas sombras,
Com os seus deuses e os seus demônios,
Com as suas mortes e os seus nascimentos,
Por isso o medo do que se esconde
Além da porta das cavernas que ainda guardo
em meu olhar.

Desde o primeiro lampejo de dúvida, venho.
Desde quando o raio queimou a árvore
E, mais com assombro do que com temor,
Nos aproximamos do irresistível fulgor das chamas.

Desde o primeiro gesto de coragem, venho.
Quando nos atrevemos a roubar o fogo
E desafiamos, para sempre, o frio e a escuridão.

Incontáveis luas e sóis cruzaram os céus,
Cometas feito símbolos marcaram nossas noites,
Eclipses feito monstros devoraram nossos dias,
Estações de seca desenharam a aridez
de mil desertos,
Estações de cheias formaram rios e pantanais,
E eu ainda desvendava os primeiros segredos,
E ainda aprendia a dar os meus primeiros passos,
Feito uma criança abrindo os olhos para o mundo.

Desde a primeira palavra, venho.
Desde o primeiro lobo que se acercou a mim,
E era a primeira vez que não nos víamos
como inimigos,
E juntos, ao redor da fogueira, nos observamos
Nos alimentamos e nos protegemos do frio.
Por essa razão ambos ainda guardamos nas retinas
A antiga e misteriosa adoração às labaredas.

Desde a primeira pergunta, venho.
Necessária encruzilhada entre o ser e o saber...
E, depois disso, nunca mais seríamos os mesmos,
Para o bem ou para o mal.
Desde quando aprendemos a engendrar o fogo, venho.
Desde quando olhamos no espelho das águas e vimos
nelas a face de Deus,
Quando nos sentimos, por primeira vez,
iguais a um Deus...
Capazes de fabricarmos com as nossas mãos
o nosso próprio sol.

Martim César

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