Por
onde passou o
Condor
Dizem
que nunca morreram.
Que
estão aí. Que renasceram uma e mil vezes,
Por
mais que os fuzilem.
Por
mais que os desapareçam.
Por
mais que pensem que eles se calaram.
Estão
aí... Hidalgo se chamam. Morelos também. E Zapata.
E
centenas mais. Milhares mais. Milhões mais.
Pois
têm a estranha mania de se multiplicar.
E,
assim, causar a fúria dos que se creem acima dos mortais.
São
esses meninos que enfrentarão os tanques,
Com
uma flor para ofertar.
São
essas meninas que aparecerão nos jornais,
Como
perigosas guerrilheiras,
Como
desajustadas crias de uma família cristã.
Essas
que teriam tudo para serem devotas e obedientes,
Mas
não são. Pois têm o bendito defeito de se rebelar.
Maravilhosas
ovelhas negras
Que
não se curvarão jamais frente à opressão.
Rigoberta
se chamam. E Maria Helena. E Delmira. E Anaclara.
Aí
estão... rompendo os casulos hipócritas de um poder
Que
se sustenta alimentando a si mesmo.
São
esses que não se submetem ao poder dos poucos
Que
querem comandar a muitos,
Argumentando
que sempre foi assim,
Por
que assim Deus quis...
E
o Deus que assim quis foi, é claro, o dos seus altares,
Onipresente
e opressivo, rico e conservador.
Um
Deus homem, por
supuesto.
E
que deve ser chamado de senhor...
A
quem devemos fé e submissão.
Esse
que não é o dos sem-teto e o dos sem-terra,
Embora
se disfarce como se assim fosse.
Esse
que não é o dos milhões de subjugados
Por
todos os cantos deste mundo,
Pelos
séculos dos séculos, amém.
Dizem
que seguem mais vivos do que antes,
Que
suas vozes transcenderam os calabouços.
Que
são muitos e que gritam por justiça,
Mais
do que nunca.
Dizem
que a terra que os cobriu
Não
conseguiu encarcerar as suas almas.
Elas
sussurram. Elas murmuram. Elas falam.
Elas
gritam pelas bocas dos homens novos.
Das
mulheres novas. E elas não pedem. Exigem!
Elas
não reclamam, vão em busca!
Constroem
o futuro. Preparam o caminho.
São
vozes de Martí. De Neruda. E de Sandino.
São
vozes de Guevara. E de Lamarca. E de Zumbi.
São
vozes de Lilian e Universindo. De Juan e de Rodolfo.
São
palavras de Allende, ressoando dentro de nós.
São
alamedas por onde cruzam os homens novos.
As
mulheres novas, sem dogmas nem preconceitos.
Os
que construirão esse futuro que mais cedo que tarde,
Ainda
chegará. Onde o homem não será o algoz do homem.
Onde,
enfim, saberemos que todos somos um só.
Onde
o mais humilde será o mais privilegiado
Como
nos disse, certa vez, um dos primeiros visionários
Desse
tempo que um dia ainda haveria de chegar.
São
vozes de Violeta, de Dolores e de Elena.
De
Elena, sim, e de sua mãe Tota Quinteros.
Nunca
se esqueçam! Arrancadas da vida para a eternidade.
Uma
pelas lembranças, cada vez mais vivas, de sua filha,
Pelo
amor infinito que deveria ser o de todo ser humano.
Outra
pelas garras dos chacais protegidos por suas fardas.
Elas
aí estão. E eles, os chacais, há muito já se foram.
Que
a terra nunca lhes seja leve.
Que
a mãe-terra os deserde e lhes pese sobre os ossos.
E
mesmo os que ainda vivem estão mortos,
Tentando
se esconder, em vão, atrás de justificativas inúteis,
Pois
a obediência devida e o ponto final já não lhes protegem.
Já
não lhes servem de escudo. Não disfarçam suas garras.
Não
lhes salvaguardam a consciência. Não lhes absolve.
Não
lhes defendem da visão dos seus atos sanguinários.
Pois
esses que usaram a espada contra a utopia,
Esses
que covardemente se esconderam atrás de fuzis,
E
de canhões. E de metralhas, covardemente,
Como
abutres devorando a própria espécie,
Esses
morreram e morrerão para todo o sempre,
Com
seus nomes esquecidos. Manchados.
Apagados.
Por não merecerem nossa voz.
Estarão,
para sempre, condenados pela infâmia e o ostracismo.
E
os que forem lembrados alguma vez,
Só
viverão por instantes. Por breves instantes,
Para
poderem morrer de novo. E de novo. E outra vez.
Cruzando
os círculos de Dante até chegarem ao último,
Onde
estarão instalados até o final...
Sim...
até o esperado final do final dos tempos.
No
último círculo. No último. E se houver outro...
Um
último círculo além do último. Ali estarão.
Para
sempre... para todo o sempre.
Martim
César
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