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quarta-feira, 23 de abril de 2014

Todavía cantamos, todavía esperamos.... Víctor Heredia



O velho e seus canários

Existem muitas formas de gritar
Mesmo quando se parece estar calado
Ainda que os jornais sigam mentindo
E não importe a vida de quem vive ao lado

Um dia roubaram daquele velho
De todos os seus relógios os horários
Levaram todos os sóis conhecidos, salvo
O dormido no amarelo de seus canários.

Ninguém sabe quanto lhe dói a dúvida
O peso dessa cruz que ainda suporta
De sempre perguntar pelo de sempre
Batendo sempre nessas mesmas portas

Noite à noite voltava a ler os jornais
Cumprindo, com paciência, seu itinerário
Escolhendo as fotos de velhos generais
Para forrar a gaiola de seus canários

Se cada um aparece ao mundo quando nasce
E no dia em que morre então desaparece
O que, enfim, parece ser um desaparecido
Nome sem corpo, tumba que só tem a prece?

Quanto mais se presume que chegou o fim
Mais seu renascimento costuma ser diário
Pois o contrário da morte não é a vida
E sim essa dúvida da morte ao contrário

Tinha corpo o filho que um dia viu nascer
E que - sem adeus - sumiu do seu olhar
Ninguém nunca se parece a um desaparecido
Alguém que não se foi, mas nunca mais irá voltar.



Mauricio Raupp/Martim César

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